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Resumo do artigo “Unraveling Overcontrolled and Undercontrolled Nonsuicidal Self-Injury: A Grounded Theory”.

Resumo do artigo “Unraveling Overcontrolled and Undercontrolled Nonsuicidal Self-Injury: A Grounded Theory”.

Resumo

No perfil de Desregulação Emocional (DE), o Comportamento de Automutilação Sem Intenção Suicida (CASIS) ocorre de forma impulsiva, em resposta a picos de emoções intensas, muitas vezes na presença de outras pessoas ou em contextos sociais. Essas pessoas raramente planejam o ato; cortam-se de modo mais extenso e arriscado, com pouca preocupação em esconder as lesões, usando a dor como mecanismo imediato de regulação emocional. Por outro lado, pessoas que se identificam no perfil Supercontrolado (SC) se caracterizam por apresentar comportamentos guiados por regras rígidas, aguardando momentos de total privacidade, escolhendo áreas do corpo facilmente ocultáveis e controlando a profundidade do corte.

Ellison, et al. (2025) investigou essas diferenças por meio de entrevistas semi estruturadas com vinte participantes (dez SC e dez DE). Notou-se uma transição dos perfis ao longo da vida: participantes SC relataram episódios de “vazamento emocional” (parecido com episódios DE) que resultaram em comportamentos mais impulsivos, muitas vezes marcando o último episódio de CASIS. Ademais, aqueles que inicialmente se identificavam como DE, descreveram, ao longo do tempo e sob influência de críticas externas ou amadurecimento, uma transição gradual para padrões mais planejados e reservados (característico de SC).

Quanto à interrupção do CASIS, os perfis apresentam trajetórias que se diferenciam em função de suas características centrais. Para indivíduos SC, a forte capacidade de autocontrole e o comportamento governado por regras sustentam uma decisão de cessação estável. Já no perfil DE, a impulsividade e a menor capacidade de antecipar e conter gatilhos fazem com que a cessação se dê de forma gradual; dependendo de suporte interpessoal e do desenvolvimento de novas habilidades de regulação emocional. Além disso, participantes SC frequentemente expressaram sentir-se moralmente superiores a quem oscilava em impulsividade, usando termos como “correto”, “mais puro” e “melhor” para descrever seu próprio CASIS, e julgando com severidade quem tornava visível seu sofrimento. Sentiam orgulho na capacidade de controlar seus impulsos e esconder o comportamento. Em contraste, indivíduos DE relataram sentir que o CASIS de outras pessoas pareciam “mais corajoso” ou “mais impactante”, o que os levava a conectar-se e conversar com quem também se automutilava; encontrando, nessas trocas, um espaço de ajuda mútua.

Em relação ao manejo desses casos, para indivíduos com perfil DE, o foco do tratamento deve estar no fortalecimento do controle inibitório e na ampliação da tolerância ao desconforto emocional. Essas pessoas tendem a ter CASIS em função de respostas emocionais intensas, de forma impulsiva e pouco planejada, o que exige intervenções que ajudem na ampliação de repertório comportamental para o manejo dessas emoções. Nesse sentido, a DBT tradicional é mais indicada para esse perfil.

Já para indivíduos SC, a RO DBT se mostra particularmente indicada, uma vez que esse modelo foi desenvolvido visando pessoas desse perfil. No caso do CASIS em perfis SC, o comportamento é governado por regras rígidas e por um forte autocontrole, o que leva essas pessoas a manterem o comportamento em sigilo, com uma alta necessidade por estrutura (muito organizados para os momentos de CASIS) e com extrema inibição emocional. Por isso, a intervenção clínica, a partir dos princípios da RO DBT, é essencialmente balizada pela abertura radical e melhora da sinalização social.

Comentários
A despeito das contribuições relevantes, o artigo apresenta algumas limitações importantes que precisam ser consideradas na interpretação dos achados. A identificação dos perfis SC e DE foi feita com base no auto relato dos participantes, o que, em diversos casos, não correspondia exatamente ao perfil de CASIS que eles descreviam em suas narrativas. Isso sugere que alguns participantes se autodeclararam como pertencentes a determinado perfil, mas, ao relatarem suas experiências com a automutilação, evidenciaram características mais alinhadas ao perfil oposto. Além disso, o estudo não utilizou instrumentos psicométricos validados para avaliar traços de controle emocional, impulsividade ou rigidez comportamental, o que limita a precisão da tipificação dos perfis. Nessa ótica, foi utilizada uma amostra pequena, majoritariamente composta por mulheres brancas, o que restringe a generalização dos resultados para populações mais diversas. Essas limitações apontam para a necessidade de pesquisas futuras que utilizem avaliações estruturadas, amostras mais amplas e instrumentos específicos para validar e refinar a distinção entre os perfis SC e DE no contexto da CASIS. 

Outro ponto a se observar, além disso, é em relação à transição dos perfis SC e DE: o que muda, ao longo do tempo, é a topografia dos CASIS, e não necessariamente uma transição funcional e duradoura para o perfil SC. Provavelmente, essa mudança reflete um comportamento que passa a estar sob o controle de contingências aversivas. Inicialmente, pessoas que se encontram no perfil de DE apresentam topografias impulsivas de CASIS. Ao longo da vida, porém, muitas dessas mesmas pessoas começam a adotar um repertório topograficamente similar ao do perfil SC. Funcionalmente, esse comportamento ocorre sob o controle discriminativo de estímulos aversivos, que sinalizam a probabilidade de punição caso o CASIS seja emitido. Mantendo-se, então, por reforço negativo, na medida em que ocultar as lesões evita esses estímulos desagradáveis. Ou seja, ao ocultar o comportamento, o organismo reduz imediatamente a probabilidade de punições sociais (retirada de estímulos aversivos), o que reforça a forma planejada e reservada de CASIS. Esse repertório é mantido porque ocorre um alívio imediato da apreensão e da vergonha, fortalecendo topograficamente um padrão de autocontrole que, na verdade, é mantido pela contingência de reforço negativo, e não por uma mudança duradoura para o perfil SC.

REFERÊNCIA:

Ellison, S. E., et al. Unraveling Overcontrolled and Undercontrolled Nonsuicidal Self-Injury: A Grounded Theory. The Professional Counselor, v. 15, p. 81-98, 2025. DOI: 10.15241/see.15.2.81. 

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Escrito por Rodrigo Mendonça

Graduando em Psicologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente, participa de uma Iniciação Científica no Laboratório de Terapias Contextuais (LATCON) da UFRJ, além de atuar como estagiário em Terapia de Aceitação e Compromisso na Divisão de Psicologia Aplicada da UFRJ e no Centro de Avaliação, Atendimento e Educação em Saúde Mental (CAAESM), com foco em Terapia Comportamental Dialética Radicalmente Aberta (RO-DBT).

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