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Além da armadura: reflexões sobre a fábula do cavaleiro preso

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A fábula “O Cavaleiro Preso na Armadura” é uma rica narrativa que nos convida a refletir sobre o impacto dos padrões de funcionamento rígidos na regulação emocional e nas capacidade de interagir socialmente de maneira recíproca e gerar isolamento por consequência. O processo terapêutico na RO DBT busca expandir a variabilidade comportamental, a fim de estabelecer uma sinalização social mais genuína e incentivar a abertura radical.

Essa transformação é especialmente relevante quando consideramos os quatro déficits centrais associados ao SC na RO DBT. O primeiro, baixa receptividade e abertura, manifestada pela resistência a novas experiências, é evidente no comportamento do cavaleiro, que evita interações espontâneas e mantém sua armadura como uma barreira contra a imprevisibilidade da vida. O segundo, baixo controle flexível, aparece em sua necessidade compulsiva de estrutura e previsibilidade, o que o impede de se adaptar a mudanças e de explorar novas possibilidades de conexão. O terceiro, expressão emocional inibida e baixa consciência emocional, pode ser observado na dificuldade do cavaleiro em demonstrar seus sentimentos, tornando suas interações sociais mecânicas e distantes. Por fim, o quarto déficit, baixa conexão social e intimidade com os outros, manifesta-se em seus relacionamentos frágeis e distantes, nos quais a armadura funciona como um obstáculo para o desenvolvimento da proximidade social.

Assim como o cavaleiro precisa modificar seu repertório comportamen interações sociais. Na história, o cavaleiro, vestido em sua armadura protetora, representa uma pessoa que aprendeu a adotar comportamentos de controle excessivo como estratégia para lidar com o ambiente. Essa armadura, embora ofereça uma sensação de previsibilidade e segurança em primeiro momento, acaba por restringir sua capacidade de interagir de forma flexível; dificultando a conectividade social. Essa narrativa se alinha aos conceitos centrais da Terapia Comportamental Dialética Radicalmente Aberta (RO DBT), uma abordagem terapêutica desenvolvida para indivíduos com padrões de Super Controle (SC) – caracterizado, em linhas gerais, por uma pessoa que exibe um nível de autocontrole que limita sua capacidade de aproveitar a vida, ser flexível quando necessário e se conectar com os outros de maneira significativa.

Na RO DBT, assim como na fábula, a “armadura” simboliza padrões de comportamento para evitar desconforto emocional e situações com uma alta imprevisibilidade. Essa rigidez, porém, que inicialmente parecia favorável, pode restringir atal para ampliar sua capacidade de interagir socialmente, pessoas SC são incentivados, na RO DBT, a aumentar sua flexibilidade e a diversificar suas respostas aos desafios sociais e emocionais. Nessa jornada, o papel do terapeuta na RO DBT, que atua como um “embaixador”, assemelha-se ao do mago Merlin na fábula: modelando o comportamento – exemplificando flexibilidade, abertura e a prática da bobagem terapêutica – ajudando na conectividade social – reconhecendo a dificuldade em formar relacionamentos mais íntimos e ajudando na sua sinalização social – e praticando a abertura radical ao demonstrar transparência e vulnerabilidade. Em suma, o terapeuta fomenta a prática de auto investigação e a desenvolver habilidades de sinalização social; facilitando a transição de uma postura rígida e fechada para uma mais flexível e aberta.

Essa mudança, embora desafiadora, é essencial para uma vida mais conectada, em que a vulnerabilidade é vista como um comportamento primordial para criar e fortalecer os laços sociais. Assim, tanto o cavaleiro quanto o paciente em terapia são convidados a iniciar uma jornada de ampliação de repertório comportamental e de interações mais flexíveis e genuínas. Construindo vidas valiosas e que valham a pena serem compartilhadas. 

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Escrito por Rodrigo Mendonça

Graduando em Psicologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atualmente, é monitor da disciplina Processos Cognitivos 3, focada em temas sobre aprendizagem e memória, além de atuar como estagiário em Avaliação e Reabilitação Neuropsicológica na Divisão de Psicologia Aplicada (DPA) da UFRJ e no Centro de Avaliação, Atendimento e Educação em Saúde Mental (CAAESM), com foco em Terapia Comportamental Dialética Radicalmente Aberta (RO-DBT).

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